Pular para o conteúdo principal

Estudo do Inconsciente

 Inconsciente: Perspectivas Filosóficas e Psicanalíticas O estudo do inconsciente tem sido uma das áreas mais fascinantes e complexas da filosofia e da psicologia. Desde os tempos antigos, filósofos têm contemplado a natureza oculta da mente humana, enquanto a psicanálise, especialmente através dos trabalhos de Sigmund Freud e outros psicanalistas contemporâneos, tem lançado luz sobre as camadas profundas da psique humana.  Este breve texto visa explorar essas perspectivas, desde os fundamentos filosóficos até as contribuições contemporâneas da psicanálise, incluindo importantes figuras brasileiras nesse campo. Filosofia e o Inconsciente A investigação filosófica sobre o inconsciente remonta aos tempos antigos, com Platão sugerindo a existência de uma alma dividida em camadas, algumas das quais permanecem inacessíveis à consciência. Aristóteles, por sua vez, discutiu o papel dos sonhos como reveladores de desejos e preocupações ocultas.  No entanto, foi com a ascensão da psicanálise qu

Discussão do filme Desejo e Reparação (2007)

Abaixo elencamos os principais conceitos da teoria Kleiniana e Winnicottiana ao contexto dos filmes -- “Precisamos falar sobre o Kevin” (2011) e “Desejo e Reparação” (2007), com leitura crítica de contextos do cotidiano articulando com conceitos psicanalíticos dos referidos teóricos.


SINOPSE: DESEJO E REPARAÇÃO (2007)


2.1 DISCUSSÃO: DESEJO E REPARAÇÃO 

Melanie Klein foi uma psicanalista ímpar em suas contribuições que são  estudadas até os dias atuais. Ao se ater em suas experiências pessoais e  clínicas, desenvolveu conceitos e estudos que nos permitem uma ampla e  profunda compreensão acerca do indivíduo desde seus primeiros dias de vida.  

Por meio do filme “Desejo e Reparação” foi nos possibilitado fazer uma análise  correlacionando cenas do filme com conceitos kleinianos. Dessa forma, podemos iniciar a discussão articulando os conceitos de inveja e ciúme.  


“A inveja é o sentimento raivoso de que outra pessoa possui e desfruta algo desejável – sendo o impulso invejoso o de tirar este algo ou de estragá-lo. Além disso, a inveja pressupõe a relação do indivíduo com  uma só pessoa e remonta à mais arcaica e exclusiva relação com a  mãe. O ciúme é baseado na inveja, mas envolve uma relação com, pelo menos, duas pessoas; diz respeito principalmente ao amor que o indivíduo sente como lhe sendo devido e que lhe foi tirado, ou está em perigo de sê-lo, por seu rival. Na concepção corriqueira de ciúme, um homem ou uma mulher se sente privado, por outrem, da pessoa amada." (KLEIN, 1957, p.212) 


Logo no início, ver sua irmã Cecília num momento de interação com  Robbie próximo ao chafariz, foi um dos fatores desencadeantes de tais  sentimentos em Briony. 


Partindo desse ponto inicial, observa-se que a jovem de 13 anos, tendo  Robbie como seu objeto de amor, demonstra sentir-se ameaçada por sua irmã.  Em decorrência disso, é gerado nela o que Melanie Klein viria a conceituar como  ciúmes, por identificar que seu objeto de amor está direcionado a alguém que  não ela e, como consequência, o sentimento de inveja passa a predominar  nesse momento, sendo esse impulso invejoso o que leva Briony a tentar de todas  as formas possíveis manter Cecília e Robbie separados. 


A agressividade,  também característica desse momento, a leva numa busca pela destruição do  objeto. A fim de contextualizar as colocações anteriormente feitas, cabe citar o  momento no filme em que, mesmo identificando que o responsável era Paul  Marshall, a garota, ao depor na polícia, aponta Robbie como sendo o  responsável pelo abuso sexual de sua prima Lola Quincey. Logo em seguida, no  momento da chegada de com os gêmeos – até então perdidos –, Robbie tem 

sua prisão decretada e, lá de cima da janela, Briony observa-o sendo levado  para a prisão denunciando assim um sentimento de “dever cumprido”. 


Antes de alcançar o que Klein denominaria de posição depressiva, nota se que Briony, desde o início, encontrava-se num momento de sua vida onde  predominavam impulsos destrutivos e uma ansiedade persecutória  característicos da posição esquizo-paranóide. 


Além disso, uma outra  característica marcante desse momento é o mecanismo de cisão, sendo uma  defesa fundamental ao ego num momento de maior fragilidade, onde as relações  de objeto são parciais. A ambivalência, característica desse processo de  clivagem, nos remete aos conceitos de seio bom e seio mau. 


Ao longo do filme,  utilizando-se desses conceitos de forma metafórica, podemos identificar que ao  mesmo tempo em que Robbie é tido como um objeto de amor, aquele que possui  tudo aquilo que a garota almeja e deseja, ele também é visto como alguém  castrador, que a priva da satisfação de seus desejos, aquele objeto que, como  diz Klein (1946) ao discorrer sobre o seio mau “retém para si o leite, o amor e os  cuidados associados ao seio bom”. 


Seguindo o raciocínio anteriormente estabelecido e, ainda atrelando à  uma correlação com o que encontramos na posição esquizo-paranóide,  podemos articular outros dois pontos defendidos por Melanie Klein em sua teoria,  sendo o superego precoce e o édipo precoce. 


Ao discorrer acerca do  desenvolvimento psicossexual, Klein estabelece fases muito importantes como  por exemplo sádico-oral e sádico-anal. No período sádico-oral tem-se uma certa  predominância do mecanismo de introjeção, enquanto na outra, há o predomínio  do mecanismo de projeção. 


Por ser dotado de uma angústia que, a princípio  não consegue lidar, o bebê a projeta para o exterior. A formação de um  superego precoce se dá justamente no processo decorrente de tais projeções  e introjeções, momento no qual a destrutividade do bebê projetada para o  externo se volta contra ele e, sendo assim, tal instância precocemente  desenvolvida apresenta um rigor sádico. 


Sádico no sentido de que, diferente dos  adultos, o bebê possui um ego incipiente, não é dotado de linguagem nem  pensamento e, tais fatores, implicam em sentir de forma mais forte esse  superego tirânico. Dessa forma, chegamos a conclusão de um sentimento de culpa incipiente em desenvolvimento. Culpa essa, decorrente do sadismo  infantil. 


No decorrer do filme, de certa forma é possível notar que houve uma falha no processo de estruturação do superego em Briony, visto que ao injustamente  denunciar Robbie e até mesmo ao mostrar aos outros a carta escrita por ele para  Cecília como uma falsa prova de crime, não houve a princípio sentimento de  culpa nem sequer de arrependimento. 


Alguns dos fatores que inserem o bebê no conflito edipiano precoce são justamente a introjeção do objeto de amor e a ambivalência, relação de amor e  ódio com tal objeto. Além disso, seguindo o mesmo raciocínio freudiano a  respeito da triangularidade edípica, Klein postula que num momento inicial há essa triangulação nas relações entre o bebê, a mãe e um outro, o estranho.  


Tendo comentado brevemente a respeito do superego precoce e do complexo de Édipo precoce, cabe aqui dizer que tal triangularidade e  frustrações sentidas anteriormente mencionadas, se transpostas ao contexto do  filme, podem ser notadas na relação entre Briony, Robbie e Cecília, visto que  Robbie, considerado o objeto de amor de Briony, é sentido como ausente, como castrador, como direcionado a um outro, ao estranho que, nesse contexto, tal  posição seria ocupada por Cecília. É justamente por meio dessa falta que a triangularidade se forma. 


Após alguns anos, Briony, numa fase mais madura e com um ego mais  integrado, alcança o que anteriormente já havíamos mencionado, a posição  depressiva. 

Nesse momento de sua vida, a moça é capaz de reconhecer o erro  que cometeu anos atrás, assumir a responsabilidade por suas ações e buscar uma forma de reparação. O sentimento de culpa em decorrência da  agressividade dirigida ao objeto faz com que surja, nessa posição, o que denomina-se ansiedade depressiva. 


No filme, uma das cenas na qual é possível  notar essa busca pela reparação é justamente quando ela envia uma carta à  sua irmã Cecília a fim de conversar sobre o ocorrido. Como apresentado na história, tal reparação não é possível pois tanto Robbie  quanto Cecília morrem em decorrência da guerra, embora em contextos  diferentes. 


Já Briony, que desde o início demonstrou um gosto pela escrita, ao  final da trama, em uma idade mais avançada, conclui e publica seu livro “Reparação” como sendo uma forma possível de tentar reparar todo seu feito. Por meio do livro, foram desenvolvidas partes da história como ela gostaria que tivessem acontecido. 


Por fim, algo interessante a ser pontuado é a expressão da capacidade criativa, onde Melanie Klein  (1957) pontua “Verifiquei também que os desejos não satisfeitos do bebê – que  são em certa medida impossíveis de serem realizados – contribuem como fator  importante para suas sublimações e atividades criativas."



SINOPSE: PRECISAMOS FALAR SOBRE O KEVIN (2011)



2.1 DISCUSSÃO: PRECISAMOS FALAR SOBRE O KEVIN (2011) 



O filme "Precisamos Falar Sobre o Kevin", Eva (Tilda Swinton) nos trás a história de uma mulher depressiva, que após o falecimento/assassinato do marido e filha, passou a morar sozinha e teve sua casa e carro pintados de vermelho. Maltratada nas ruas, foi responsabilizada pela comunidade, pela ação de seu filho Kevin, que demonstra ter comportamento não-integração primária, apontando falhas no ambiente em que teve seu desenvolvimento, com personalização e realização. 


Eva tenta recomeçar a vida com um novo emprego e vive temerosa, evitando as pessoas (perde o sentido social). O motivo desta situação vem de seu passado, da época em que era casada com Franklin (John C. Reilly), e com quem teve dois filhos: Kevin (Jasper Newell/Ezra Miller) e Lucy (Ursula Parker). O relacionamento da mãe com o primogênito Kevin sempre foi complicado desde o seu nascimento, tendo dificuldade de interagir num relacionamento interpessoal com o filho ainda bebê. 


Com o tempo a situação foi se agravando, gerando um vínculo de apego em relação a mãe, visando um proveito mútuo, jamais imaginaria do que ele seria capaz de praticar tal ato desumano, para atingi-la com essa barbaridade. A partir da teoria winnicottiana, percebemos o fenômeno de desintegração, com regressão e fracasso e o fenômeno da personalidade – não está integrado na fase primária.


Winnicott teve contribuições indiscutíveis no campo psicanalítico e, por meio do filme “Precisamos falar sobre o Kevin”, pudemos, à luz de sua teoria, realizar uma análise correlacionando com suas ideias.


Mesmo nos momentos iniciais do filme já era possível de se identificar alguns dos desdobramentos possíveis para a história a ser apresentada. Winnicott, em sua teoria, deu muita ênfase ao ambiente e à capacidade inata de desenvolvimento e integração do indivíduo desde o momento de seu nascimento sendo essas questões possibilitadas em decorrência do que denominou-se “processo de maturação” que, no que tange o plano do psiquismo:


“[...] aplica-se à formação e à evolução do eu, do isso e do supereu, bem como ao estabelecimento dos mecanismos de defesa elaborados pelo eu num indivíduo sadio. A saúde psíquica, por tanto, repousaria no livre desenrolar desses processos de maturação.” (ARCANGIOLI, 1995, p. 183)


Para que o processo anteriormente mencionado seja possível, é necessário que, num primeiro momento, essa provisão ambiental seja facilitada por meio da mãe ou por um outro indivíduo que ocupe e exerça a função de cuidador. Pois, logo nos primeiros meses de vida, o bebê passa por uma fase na qual não consegue se distinguir do meio e depende exclusivamente desse mundo que é apresentado pelo cuidador. Tal fase é denominada “dependência extrema”. (ARCANGIOLI, 1995)


Dessa forma, nos debruçando sobre os conceitos elaborados por Winnicott é interessante analisar o filme sob o viés da história precoce dos distúrbios das crianças. Isso porque o pediatra e psicanalista inglês dá ênfase à história falada - não necessariamente como uma manifestação inconsciente. Winnicott expõe um relato de experiência e começa a dar valor, não apenas no relato das mães, mas tudo que é possível entender do relato da experiência da mãe (escuta).


Escutar uma certa fala como um discurso, no qual tenta compreender o que diz respeito à experiência da mãe/família, que tem a ver com a sua própria experiência Dessa forma, busca entender do que se trata essa relação contada a partir da experiência da mãe. (histórias clínicas / escuta Winnicottiana).


Winnicott questiona a teoria psicanalítica, em especial o Complexo de Édipo. Ou seja, a psicanálise tradicional não dá conta de tudo. Existe algo que falta na teoria para compreender melhor certos casos. Isto porque na década de 1920, no início dos estudos psicanalíticos, os pacientes eram pensados apenas a partir do Complexo de Édipo. 


Para Winnicott, crianças que se tornaram doentes, sejam neuróticos, psicóticos, anti-sociais, psicossomáticos relataram dificuldades no seu desenvolvimento desde bebê. Dessa forma, destacamos uma cena marcante do filme como o choro desenfreado do bebê e a falta de manejo daquela mãe diante da angústia deste. 


A cena é intensa e profunda, quando Eva está diante de um canteiro de obras e parece encontrar certa paz com o barulho de britadeiras, que abafam momentaneamente o choro de Kevin. O bebê ainda não passou pelo Complexo de Édipo e já apresenta sinais e questões de distúrbios emocionais.


Dessa forma, ​​a visão winnicottiana do processo de amadurecimento é justamente essa ideia  de "amadurecimento" o que contrapõe de certa forma a energia psíquica e a libido proposta por Freud. Ou seja, o ser humano como potência em um processo de amadurecimento, que parte de um estágio de dependência absoluta do ambiente e segue o caminho de independência relativa.


Para Winnicott, não existe um processo de amadurecimento sem considerar um ambiente favorável para o seu desenvolvimento nos primeiros anos de vida. Ou seja, esse processo deve ocorrer concomitantemente. No processo de amadurecimento, o bebê deverá seguir da dependência total para uma não dependência do ambiente. 


Entretanto, para que tal processo ocorra, o bebê irá precisar de um ambiente que facilite esse amadurecimento. No filme de 2011, a criança enfrenta um ambiente complexo de uma mãe com dificuldade em ser "suficientemente boa" ao lado de um pai negligente. Obviamente a "mãe suficientemente boa" não é a "mãe perfeita". O ambiente também precisa de elementos que facilitem o desenvolvimento do sujeito.


Para Winnicott, o bebê é um fenômeno que não pode ser isolado para observação e conceitualização. Em outras palavras, "o bebê não existe". Ele existe no colo da mãe, fora do colo da mãe, na relação da família, etc. Portanto, não dá para pensar no início do amadurecimento do sujeito sem a sua relação com o ambiente. E o que observamos na obra cinematográfica é uma fragilidade deste ambiente, pouco propício para um desenvolvimento saudável do garoto.


Em suas obras, Winnicott aponta que existe bebê psicótico, que aparentemente podem ser sadios, como vimos em uma cena do filme em que a mãe leva Kevin ao médico, que faz alguns exames e mostra que "não há qualquer disfunção". Para Winnicott, a saúde não é simplesmente a ausência de doença. 


Desse modo, a teoria winnicottiana propõe que o ser humano no início de sua vida necessita ser cuidado. Ou seja, é preciso que ocorra um processo de integração do si mesmo, de separação do eu-outro, de que exista o eu e o não eu. Uma cena do filme onde a diretora tenta mostrar essa dificuldade e a relação simbiótica com a mãe, é quando vemos Eva mergulhando a cabeça na água e quando emerge da água corta para o rosto do garoto.


O bebê não nasce integrado. O processo não está garantido, mas deverá ser uma conquista maturacional. Logo, fica evidente que a relação psicossomática não está garantida, não é dada. 


Diferente da psicanálise tradicional que toma muitas coisas como "dadas", que algumas problemáticas do sujeito são mais adiantadas, o psicanalista inglês questiona de que muitas coisas ainda não estão garantidas ao nascer. Há muitas coisas que precisam ser conquistadas, todo o processo de amadurecimento é uma conquista para o indivíduo, que precisa do ambiente para atingir todas as fases de forma saudável. Conseguir viver no próprio corpo, por exemplo, não é dado. Relacionar-se com objetos, com o ambiente, com o outro, etc. deve ser conquistado e para tanto é necessário uma mãe suficientemente boa, bem como um ambiente que favoreça o processo.


No filme, a princípio é possível identificar que a gravidez de Kevin não é completamente aceita por Eva e, isso vem a ser confirmado no momento em que ela dá à luz ao menino. -- “Eva, pare de resistir!”, diz a médica no momento do parto, o que para nós, denota uma espécie de negação da gestação. Além disso, após conceber Kevin, enquanto Franklin – o pai – o possibilita um primeiro momento de acalanto e afeto, Eva aparenta estar fragilizada, sem afeição por seu filho. 


O fato de não estar suficientemente bem viria a refletir de maneira mais marcante na relação entre mãe e filho, impossibilitando assim o que Winnicott denominou “identificação” que, consequentemente, viria a impactar diretamente no desenvolvimento emocional primitivo da criança.


Como um reflexo de tal identificação prejudicada entre Eva e Kevin cabe aqui citar o momento em que ele, logo nos primeiros meses de sua vida, começa a chorar e ela se demonstra incapaz de cessar aquela inquietude do bebê. Enquanto Kevin chora incessantemente, sua mãe o coloca no carrinho e o leva à rua, encontrando um certo alívio ao se deparar com uma britadeira no caminho que emite um som capaz de sobressair o choro do menino.


“[...] se estão suficientemente bem (como a maioria está) para se entregarem à maternidade. Elas se tornam cada vez mais identificadas com o bebê, e isto elas mantêm quando ele nasce [...] Por causa dessa identificação com o bebê elas mais ou menos sabem o que ele necessita. Refiro-me a coisas vitais como ser segurado ao colo, mudado de lado, deitado e levantado, ser acariciado; e naturalmente, alimentado de um modo sensato, o que envolve mais do que a satisfação de um instinto; Tudo isso facilita os estágio iniciais das tendências integrativas do lactente e o começo da estruturação do ego. Pode-se dizer que a mãe torna o fraco ego do bebê em um forte, porque está lá, reforçando tudo, como a suspensão hidráulica de um ônibus.” (WINNICOTT, 1983, p. 67)


As questões anteriormente mencionadas, em especial a impossibilidade de uma identificação, influenciaram negativamente no desenvolvimento do que na teoria winnicottiana viria a ser definido como mãe suficientemente boa, impedindo assim, que fosse provido um ambiente facilitador para o desenvolvimento de Kevin. 


No decorrer da história, baseando-se nos momentos iniciais da vida do menino, podemos identificar que Eva não pôde se desenvolver como uma mãe suficientemente boa e, aqui pontuamos que, a ausência de um ambiente facilitador, se deu também em decorrência da falta de uma rede de apoio, pois mesmo Franklin, o pai de Kevin, não foi capaz de tal suporte.


Um ponto que discutimos é como o bebê sobrevive se essas fases do amadurecimento não forem alcançadas. Quais as dificuldades e o tipo de sofrimento que essa pessoa, que não atingiu tais conquistas, irá enfrentar e viver. Partimos do trágico desfecho da história, na qual Kevin mata o pai e a irmã para ter a mãe apenas para si.


Círculos de sustentação - família, escola, comunidade, um objeto transicional, etc. Todos estes elementos compõem um cenário facilitador ou não. Falhas no ambiente, falhas na sustentação, e no momento que esta falha ocorreu em relação ao tempo do processo de integração e amadurecimento podem ser cruciais para o surgimento de disfunções psicossomáticas.


Na teoria winnicottiana, há muitas maneiras de falar sobre o processo de amadurecimento. É um caminho pelo qual o ser humano vai se constituindo, ele parte do do "não ser" para o "ser", de "não integrado" para "integrado". Segundo Winnicott, o bebê nasce com uma tendência inata ao amadurecimento e à integralização. Ele tem uma continuidade de ser, é temporal. Ou seja, a natureza humana tem uma tendência própria de se amadurecer. E cabe ao cuidador favorecer esse processo.


Quando temos uma pessoa muito deprimida, por exemplo, não adianta dizer que o jardim está bonito com a primavera, pois quem criou esta beleza do dia bonito é o eu integrado. Eu olho para isso, acho graça e dou sentido a esse jardim bonito. E no processo maturacional e de integração é a mãe que permite essa ponte quando aponta o objeto ao bebê. Por fim, podemos considerar que no processo de desenvolvimento do Kevin houve certas falhas em diferentes estádios do amadurecimento culminando para um triste e fatídico desfecho.


CONCLUSÃO


Donald W. Winnicott e Melanie Klein são dois importantes nomes na história da psicanálise e por consequência das teorias de Klein terem tido influências nas teorias de Winnicott, alguns de seus pensamentos acabam tendo pontos em comum.


Podemos citar que ambos deram bastante relevância para o estudo das funções psíquicas desde o início do desenvolvimento do indivíduo, onde Winnicott levou em consideração alguns dos conceitos de Klein, como por exemplo a posição depressiva, o interesse nas relações com os objetos e o mundo interior. 


No entanto, os autores também possuem algumas discordâncias, como o momento em que ocorre o complexo de édipo, onde para Klein, se estabelece na fase oral, no primeiro ano de vida. Já para Winnicott, é preciso passar por diversas vivências para que ocorra a posteriori a experiência edípica, por volta dos dois anos de idade. 


Outro ponto de divergência de ambas teorias, é que Winnicott dá atenção ao ambiente como fator importante para o desenvolvimento do bebê, quanto Klein dá mais importância às pulsões.


Fato é que ambos psicanalistas da escola inglesa tiveram grande relevância para a clínica psicanalítica. Klein com suas contribuições, como por exemplo a técnica do brinquedo, na qual considera que o ato de brincar contém representações dos conflitos internos da criança e simboliza a associação livre feita pelos adultos. Winnicott, por sua vez, com a teoria do amadurecimento, desvenda uma faceta onde o indivíduo passa por diferentes fases, que são essenciais para o processo de amadurecimento e servem como uma forma de compreender os problemas emocionais e da saúde psíquica.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O homem dos lobos (Freud)

O homem dos lobos foi um caso atípico na clínica psicanalítica de Freud. Em 1910 teve início as sessões, interrompida pela guerra, em 1914. Desse modo, é considerado um caso longo para os parâmetros do Freud. Vale lembrar que na época, o psicanalista recebia o paciente 5x por semana em seu consultório na cidade de Viena, Áustria , mas a análise pessoal não durava por muitos anos, como nesse caso específico do "homem dos lobos". Após a guerra, o paciente retomou a análise com o psicanalista, em um segundo momento, estabelecendo consigo um prazo de encerramento das sessões psicanalíticas. Aliás, uma técnica ativa, que como o próprio disse, o ajudou a avançar na análise com Freud. Em seguida, segue análise com outros psicanalistas. ë conhecido na história da psicanálise por ter tido muitos analistas. Muitas das coisas das quais eu fiquei sabendo, eu fiquendo sabendo apos estabelecer esse prazo Para quem estuda psicanálise, sabe que Freud participava de reuniões com outros médico

O desejo de analista", de Bruce Fink

 O capítulo "O desejo de analista" de Bruce Fink, presente em seu livro "Introdução clínica à psicanálise lacaniana", aborda um dos conceitos fundamentais da psicanálise lacaniana: o desejo do analista. Fink argumenta que, ao contrário do que se pode pensar, o desejo do analista não é algo que pode ser completamente controlado ou eliminado. Na verdade, o desejo é parte integrante do processo analítico e pode ser usado de forma produtiva para ajudar o paciente a alcançar uma compreensão mais profunda de seus problemas. O autor destaca que o desejo do analista não é o desejo sexual, como muitos podem imaginar, mas sim o desejo de saber e de entender o paciente. Ele enfatiza que o analista precisa estar disposto a se envolver emocionalmente com o paciente, sem deixar que suas próprias questões pessoais interfiram na análise. Fink destaca a importância de o analista ter uma relação "neutra benevolente" com o paciente, em que ele não busca satisfazer suas própr

Psicologia das massas e análise do Eu (1921)

 O texto "Psicologia das Massas e Análise do Eu" de Sigmund Freud, escrito logo após a Primeira Guerra Mundial, explora os fenômenos psicológicos que ocorrem quando indivíduos se agrupam em massa. Freud analisa como a identidade individual se dissolve em favor de uma identidade coletiva, destacando a influência de líderes carismáticos, ideologias e instituições sociais na formação e manipulação das massas. No contexto do texto, tanto o exército quanto a igreja são instituições que exercem um poder significativo sobre as massas. O exército representa uma forma de organização hierárquica e disciplinada, onde a individualidade é suprimida em prol do propósito coletivo, moldando comportamentos e valores em direção aos objetivos militares. Por outro lado, a igreja exerce influência através da religião, explorando aspectos emocionais e espirituais para unir e controlar as massas. Esses temas encontram ressonância em regimes de extrema direita, como o governo de Jair Bolsonaro no Br

O início do tratamento (1913)

 "O Início do Tratamento (1913)" é um texto seminal de Sigmund Freud, no qual ele aborda questões fundamentais relacionadas ao processo inicial da psicanálise .  Neste ensaio, Freud explora a dinâmica entre o paciente e o terapeuta durante as fases iniciais do tratamento psicanalítico, fornecendo insights valiosos sobre a construção da relação terapêutica e os desafios enfrentados nesse contexto. Freud destaca a importância do estabelecimento de uma aliança terapêutica sólida e confiável, na qual o paciente sinta-se seguro para explorar livremente seus pensamentos, emoções e experiências mais profundas. Ele enfatiza a necessidade do terapeuta em oferecer um ambiente acolhedor e livre de julgamentos, no qual o paciente se sinta encorajado a expressar-se honestamente. Além disso, Freud discute a técnica da associação livre , na qual o paciente é incentivado a relatar livremente tudo o que lhe vem à mente, sem censura ou filtro. Ele destaca como essa técnica é fundamental para a